O número 31 da rua Cambon -onde Mademoiselle Chanel abriu sua loja nos anos 1920, em Paris, amanheceu quarta-feira coberto de rosas brancas em homenagem ao seu lendário herdeiro, Karl Lagerfeld, que faleceu aos 85 anos no Hospital Americano de Paris, onde foi internado na segunda-feira.
Foi Diane von Fürstenberg quem criou o apelido “génio provocador” o classificando como “uma testemunha perceptiva de tudo”.
Com ele a moda se despede do último representante da geração da roupa de autor e do luxo da era pós-costureiros.
Langerfeld era da velha escola.
Desfilou simultaneamente em dois mundos, o dos ateliers da couture e do prêt-à-porter, onde simbolizou e sinalizou as grandes mudanças no sistema de moda nos últimos 30 anos.
Afinal ele foi assistente de Chistian Dior- no auge da maison nos anos 1950, onde trabalhava colado em Yves Saint Laurent, dividindo croquis e os namorados em comum, como se viu no filme biográfico “Saint Laurent”.
Nascido na cidade de Hamburgo, na Alemanha, em setembro de 1933, Karl Otto Lagerfeld era filho de um empresário sueco com uma vendedora alemã de lingeries.
Entrou para o universo da moda após se mudar para Paris, onde se formou em desenho e história, e acabou conseguindo um emprego de assistente do estilista Pierre Balmain, ao vencer um concurso de design, na categoria “casacos”, em 1955.
Yves Saint Laurent também estava na competição, e acabou vencendo na categoria “vestidos”.
Mas foi em 1983, quando Lagerfeld assumiu o comando da Chanel -com a importante missão de manter vivo o legado deixado por Gabrielle Chanel falecida em 1971, que a luz brilhou incandescente.
Como cabeça pensante da alta-costura da maison, Karl fez história por impedir que a marca fosse à falência e foi responsável por deixá-la contemporânea, sem perder a essência.
Soube rejuvenescer o estilo sem distorcer a marca e reinventou o que Chanel criou com um sotaque atual.
Os códigos de elegância foram reciclados: a jaqueta e o terno Chanel, o pequeno vestido preto, os preciosos tweeds, os sapatos de dois tons, as bolsas acolchoadas, as pérolas e bijuterias, entre outros itens.
“Meu trabalho não é fazer o que Chanel fez, mas o que ela teria feito. Uma coisa boa sobre a Chanel é que ela é uma ideia que você pode adaptar a muitas coisas” declarou em uma entrevista.
Curioso, extremamente criativo e conhecido por não ter medo de falar o que pensa, Karl tinha um estilo pessoal personalizado, marcado pelo rabo de cavalo baixo, pelos óculos de sol usados diariamente e pelas luvinhas de couro, que deixavam as pontas dos dedos à mostra.
Criou figurinos para filmes, coleções exclusivas para artistas do calibre de Madonna, e também trabalhou como fotógrafo, sendo responsável por clicar importantes capas de revistas, como a edição da V Magazine que tinha Mariah Carey como destaque.
Uma de suas participações mais icônicas como fotógrafo foi para a Vogue Brasil, quando clicou sua gatinha, a famosa Choupette, no colo de Gisele Bündchen pra capa de dezembro de 2014.
Os desfiles da Chanel além das novas criações na passarela, tornaram-se um show por conta dos cenários-ostentação pensados por ele – um supermercado lotado de produtos com o logo da marca, uma praia completa, um foguete da Nasa, um navio de cruzeiro, entre alguns destaques.
Na minha percepção Lagerfeld jamais iria morrer e sua aparição nos finais apoteóticos dos shows da Chanel, de cabelos brancos presos em rabo e as eternas calças pretas me lembravam um Papai Noel moderno, presenteando surpresas notáveis a cada temporada.
Ainda em vida, o diretor artístico da Chanel designou a sua gata Choupette como herdeira oficial.
Com uma fortuna avaliada em cerca de 110 milhões de euros, Karl Lagerfeld garantiu numa entrevista, que o legado se estende a outras pessoas e “há suficientes para todos”.
A partir de agora, quem assume o posto de diretora criativa da Chanel é Virginie Viard, diretora do estúdio de design de moda da marca e braço direito de Lagerfeld desde 1987.
Virginie Viard chegou à Chanel quatro anos depois da entrada de Lagerfeld, através de uma recomendação para um estágio. Desde então que os dois se tornaram inseparáveis, ao ponto de colaborarem juntos em todo e qualquer contexto — como quando Lagerfeld trocou a Chanel pela Chloé, em 1992, antes de regressar em 1997.
Foi nessa altura que se empenharam em reafirmar a posição da Chanel no mercado, garantindo e supervisionando a criação de, pelo menos, oito coleções por ano da marca.
22 fev 2019 • por Nina Kauffmann • 0 Comentários